sexta-feira, 30 de setembro de 2011

O insecto e o girassol


Não sei o que aconteceu.
Se fui eu que fiquei sem asas para voar até ti.
Ou se foste tu que te afastaste para longe.

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Os figos da piteira

Que os figos da piteira tenham espinhos eu compreendo. A natureza tornou-os tão apetitosos que, se lhes não desse defesas, as piteiras não passariam da primeira geração.
Já os espinhos com que o ser humano se arma, no relacionamento com o seu semelhante, não foram uma dádiva da natureza, foram uma criação do próprio homem.

domingo, 25 de setembro de 2011

Ir à pesca e não pescar

Ir à pesca.
Estar com quem gostamos.
Parar um pouco, sentarmo-nos sobre as rochas do lago.
Sentir ao lado a vida a continuar.
Ouvir o sussurrar da natureza, o cantar das aves.
Sentir a tua presença nos que amaste.
Ir à pesca e não pescar.

sábado, 24 de setembro de 2011

Uma flor no Alentejo

Hoje, no Alentejo, uma flor.
Com pétalas sorridentes.
Transmitindo amor.
Hoje, no Alentejo, uma flor.
Que cada um de nós trouxe no coração.

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Socorro

Martim Moniz - Lisboa -Placa na Junta de Freguesia do Socorro
Há muitos, muitos anos, tantos que já lhes perdi a conta, uma mulher do povo estava feliz. Tinha trazido a este mundo um bébé.
E o pobre do pequenito, acabado de nascer ali no Socorro, em Lisboa,  apenas sabia chorar.
O miúdo cresceu e foi, também, feliz.
Tal como a mulher do povo que o deu à luz.
Pobres e felizes. E sorridentes, mesmo quando tinham necessidade de deixar correr as lágrimas que lhes inundavam o coração.

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Eu, monstro e homem

Alpiarça - Painel de um prédio
«Monstros e homens lado a lado
Não à margem, mas na própria vida.
Absurdos monstros que circulam
Quase honestamente.
Homens atormentados, divididos, fracos.
Homens fortes, unidos, temperados.»
Como eu me sinto assim, simultaneamente, monstro e homem, como neste belo poema de Alexandre O'neill, postado no blog do meu amigo António-Paulo, http://poemacomtodos.blogspot.com.

terça-feira, 20 de setembro de 2011

Cicciolina e a política

Escultura no Jardim Botânico Tropical em Belém
Li hoje num dos nossos diários que actriz porno italiana, Cicciolina, vai receber uma pensão vitalícia de 39.000 euros anuais.
Não a recebe da sua actividade profissional. Recebe a pensão porque foi deputada numa legislatura de cinco anos.
Sinceramente, vendo o que têm feito os nossos políticos, dos quais o mais recente é o nosso conhecido Alberto João, eu cada vez tenho mais respeito pelas mulheres que se prostituem para ganhar a sua vida.
Tenho, no entanto, de reconhecer que a actividade política é, contudo, a profissão mais bem paga apesar de, contrariamente à profissão de prostituta, não nos trazer prazer nenhum, antes pelo contrário.
E penso, embora só para mim, para que ninguém me ouça, como o ser humano é, ainda, tão atrasado, apesar de tanta evolução na ciência.

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Dia de pesca

17/09/2011 - Pesca no Ciborro
O corpo bem virado para a fundura da barragem, como se esta fosse um prado e ele um cavaleiro.
O olhar atento aos toques de algum peixe.
O chapéu cobrindo os raios intensos do sol.
Mas o seu coração tão triste.
Imaginou que a pesca poderia ser diferente, trazer-lhe uma restea de esperança, quem sabe se o seu espírito os teria acompanhado para aquela que seria a sua primeira pescaria.
Mas, para recordar o dia, apenas umas quantas carpas e achigãs, que tornou a devolver à água.

Servidão

Rio de Onor - 2011
«Pergunto à gente que passa
por que vai de olhos no chão.
Silêncio -- é tudo o que tem
quem vive na servidão.»
Manuel Alegre, Trova do Vento que Passa

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Fruta-pão

2011 - São João de Angolares (São Tomé)
«Chamo-me povo de São Tomé
Eu ando a par e passo com a fruta-pão
O pão de cada dia dos homens.»
Francisco Costa Alegre, Cinzas do Madala

Canoa

2011 - Canoa em São Tomé
«Canoa frágil, à beira da praia,
panos presos na cintura,
uma vela a flutuar...
Caleima, mar em fora,
canoa flutuando por sobre as procelas das águas,
lá vai o barquinho da fome.
Rostos duros de angolares
na luta com o gandu
por sobre a procela das ondas
remando, remando
no mar dos tubarões
p´la fome de cada dia.» 
Alda Espírito Santo, poetisa de S. Tomé e Príncipe (1926-2010)

terça-feira, 13 de setembro de 2011

O mergulhador

2011 - Pescador de São Tomé
O mergulhador dá os primeiros passos na direcção de águas mais profundas nas quais possa caçar o seus peixes.
Leva consigo todo um conjunto de apetrechos, esboços do que mais tarde seria a moderna espingarda de caça submarina.
No final da pescaria trouxe uns peixes-lamina, que hoje não havia muita abundância por ali.
Imaginei-me, com o meu primo Rui, no próximo fim-de-semana, a entrar pela água da barragem, e apanhar à mão a tal carpa grande que nunca quer vir pelo anzol.

domingo, 11 de setembro de 2011

A corrida da vida

2011 - São Tomé
Enquanto a máquina disparava para obter a foto, imaginava a corrida da vida, o homem insaciável, a ânsia do querer sempre mais, mesmo quando a vida está no limiar do fim do ciclo e já não se necessita de mais nada para sobreviver. Fosse outro o modo de viver do ser humano e ela estaria entre nós.
Mas a corrida que eu fotografei não era uma corrida de vida e de morte.
Era a vivência entre o homem e os outros seres filhos da mãe Terra, era o viver da juventude.
Ali bem perto, numa tenda armada junto ao mar, o pastor grita no alto-falante que «morreu hoje o teu velho eu». Fiquei a meditar em como teria de pôr fim à corrida desenfreada que nos atormenta a vida e não nos deixa viver.

Mãe preta

2011 - Escultura num jardim de São Tomé
Hoje foi um dia em que te sentiste muito triste.
Quando passei por esta escultura compreendi porque tens de assumir a felicidade no teu rosto. Sei que é estranho dizer isto, quando te sentes derrotada.
Mas repara que a mãe negra, não podendo ter os dois meninos nos braços, tem de ter muita força para segurar o que está ao colo, para que ele não caia.
E repara como o menino que perdeu o colo da mãe segura a mãozita do mais pequenino, como a dar-lhe força e amparo.
Tu és como a mãe preta, tens de continuar o caminho da vida, para dares vida ao bébé que anichas nos teus braços, sabendo que a memória de felicidade e alegria, que tanto vimos estampados no seu rosto, vai ser transmitida por mãos pequeninas e invisíveis.

sábado, 10 de setembro de 2011

O pescador

2011 - Pescador em São Tomé
Vi-o da varanda do meu quarto, logo pela manhã.
Estaria o Homem a pregar aos peixes do mar, tal como o fizera Santo António, há muitos anos?
Acerquei-me e vi então, que o Homem era um pescador, tal como Jesus, embora este o fosse de homens.
O pescador lançava o fio, com a perícia de muitas gerações. E, pescando ao sentir nos seus dedos, esperava pelo almoço. Que a natureza por aqui é farta, quer no mar, quer na terra.
Embora eu não saiba nada disso. Na mesa apareceu-me um vermelho grelhado acompanhado por banana-pão frita e fruta-pão assada.

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Equador

2011 - Vista da linha do Equador no Ilhéu das Rolas
A noite de amanhã vai ser longa. Mas, quando o dia nascer no equador, estarei lá para sentir o perfume daquela terra abençoada, cheirar o fim da gravana.
Encher os os olhos de natureza, de mar e floresta. E deliciar-me com o concon e fruta pão, preparado por mãos divinas.
Deixar-me ficar pela noite dentro no quintal da D. Tété ou no Pirata.
Ou dar dois dedos de conversa e sentir a candura daquele povo, o ritmo do leve-leve.

terça-feira, 6 de setembro de 2011

O cordão

Alfama
Nunca, como hoje, senti tanto o entrelaçar do poema, da música, da voz, como quem faz um cordão de três fios.
Enquanto se tece esse cordão espiritual eu vou chegando a ti, estejas onde estiveres.

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

A raposinha e o lobo

Gerês - Próximo da Portela do Homem

Então, a raposinha depois de se apanhar com as botas que os senhores compraram na feira, foi por esses campos fora, muito contente, com as botas calçadas.
Mas o lobo, que andava por ali perto, viu vir a raposinha e escondeu-se.
- Olá comadre raposa!
- Que susto que me pregaste compadre lobo.
- Mas que lindas botas que trazes. E como te ficam bem.
- Obrigado compadre lobo. Fui eu que as fiz, disse a raposinha cheia de vaidade (e a mentir, claro).
- Foste tu? Não me estás a enganar?
- Claro que não compadre Lobo. Se quiseres também te faço umas, disse a raposinha, já a pensar como haveria de enganar o Lobo.
- Ai como eu gostava de ter uma botas assim. Ando com os pés tão feridos. O que queres para me fazeres umas iguais às tuas?
- Só preciso de três carneiros bem gordos, para a pele vir esticada, disse a raposa já a babar-se com o que iria comer.
....
Hoje, serias tu a corrigir a minha estória e a contar-ma da seguinte maneira.
O anjinho do céu, que antes era a raposinha morta pelo velho grou que já não tinha idade para voar, foi levado por muitos anjinhos à presença do Senhor Deus.
Mas antes de chegar, recebeu tantos beijinhos de anjinhos. Até o menino da Ofélia que tinha partido cedo ali estava para o receber.
O Senhor Deus tomou o anjinho dos céus nos braços e disse-lhe:
- Minha querida, cumpriste o que te era destinado. Enquanto algumas almas terão de regressar vezes sem conta, tu atingiste a perfeição. E eu necessitava de ti aqui a meu lado.
E continuou o Senhor Deus:
- Tal como o lobo perguntou o que necessitavas para fazer as botas, eu pergunto-te o que necessitas para transmitir a tua felicidade, o teu carinho, o teu sorriso, àquelas almas que vivem na terra.
Senhor Deus meu, pedia-te apenas três coisas:
- que dês coragem aos meus pais da terra para que sejam felizes e façam da minha mana uma raposinha feliz;
- que eu possa ser uma bailarina aqui nos céus;
- e que a minha estrelinha fique mesmo por cima da casa dos meus pais. Sabes, a minha mãe fica a dar mama à minha mana raposinha. Mas o meu pai sai sempre até à rua. Ali fuma um cigarro e observa as estrelas. Assim, quando me ver chama a minha mamã.
- Assim será meu anjo do céu. E, então, a menina saiu do pé do Senhor, com todos os anjinhos do céu, todos a dançarem aqueles passos do ballet da Carmen, como no sarau de 2010.

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

A raposinha e as botas

Azulejos no Mercado de Santarém
A raposinha, com fome, abriu a boca e... catrapuz. Largou o grou e veio por aí abaixo.
Mas quando a raposinha vem a chegar ao chão ia a passar um carro de bois, carregado de palha. E a raposinha caíu mesmo no meio da palha.
Como os carros de bois andam devarinho, a raposinha teve tempo de acordar antes dos homens darem com ela. E ao acordar, olhou para um lado, olhou para o outro e viu que estava viva.
E, também viu um belíssimo par de botas que os homens tinham comprado na feira. Que ricas botas, pensou. E, quando os homens foram pelas botas, correram a palha toda, mas botas nada. A raposinha tinha-as calçado e fugira com elas para a floresta. Não sabia que mais à frente estava o lobo escondido à sua espera.
...
Como te dizia, para mim a estória não se passou assim.
O grou, que era velho e já não tinha condições para voar, atirou com a raposinha para o meio do chão. A queda foi tão violenta que a raposinha morreu.
Então, aconteceu uma coisa que eu não sabia que era possível, quando te contei a estória.
A raposinha deitada no chão e as raposas todas à volta dela, a chorarem. Ao mesmo tempo, muitos anjinhos desciam à terra e rodeavam a raposa. E, por entre cânticos lindos e suaves (como o Avé Maria das Celtic Woman) levaram a raposinha para os céus. Eu sei que é difícil explicar. Como podia ela estar na terra e ao mesmo tempo ir a caminho dos céus. Mas agora percebes que é possível.
Chegados aos céus vestiram a raposinha toda de um tecido branco, acetinado e uma fada, linda como o sol, com uma varinha de condão, fez nascer-lhe umas asinhas.
E, depois, os anjinhos que a rodeavam disseram-lhe: agora já não és a raposinha. És um anjinho dos céus, como nós.
Anda connosco que o Senhor Deus espera-te para te dar um beijinho.